TRAPALHADAS POLÍTICAS E ERROS TRIBUTÁRIOS

A nova crise política nacional desencadeada com a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro da Casa Civil do governo Dilma, além de colocar combustível no processo de impeachment da presidente, iniciado em razão das pedaladas fiscais, deve comprometer a meta de arrecadação de impostos da Receita Federal com o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT). A regulamentação do RERCT foi publicada pela Receita Federal dias atrás, com importantes alterações em relação ao texto originalmente apresentado para a consulta pública. Essas alterações demonstram o empenho da Receita Federal na submissão da regulamentação ao texto da lei e às diversas sugestões recebidas no período de consulta pública. Muitos brasileiros que formaram patrimônio no exterior o fizeram justamente em razão da instabilidade política e econômica do Brasil. Apesar disso, o anúncio da regulamentação foi engolido pela nomeação de Lula para a Casa Civil e a crise política que isso desencadeou. A decisão da presidente Dilma Rousseff fez as bolsas subirem e provocou queda no dólar. Além das reações econômicas, a decisão teve impacto na disposição dos contribuintes em aderir ao RERCT. Inicialmente, a previsão da Receita Federal era a de regularizar até R$ 200 bilhões em bens e ativos de brasileiros no exterior. Com a nova crise política, essa meta corre o risco de não ser atingida nem em 50%. Muitos brasileiros que formaram patrimônio no exterior o fizeram justamente em razão da instabilidade política e econômica do Brasil. A atual crise política, as mudanças na equipe econômica e a formação da comissão especial da Câmara dos Deputados que quer analisar o pedido de impeachment da presidente Dilma em 45 dias formam um cenário pouco propício para qualquer movimento de repatriação. Alguns contribuintes que já estavam se preparando para aderir ao regime especial de regularização estão reavaliando a decisão de repatriar recursos. Os que aderirem devem manter a integralidade dos recursos no exterior, sem trazer esses bens e ativos para o Brasil. Estima-se que o patrimônio não regularizado de brasileiros no exterior seja de aproximadamente R$ 500 bilhões. Quando planejou o RERCT, o governo esperava regularizar 40% desse total, mas a meta pode nem sequer atingir a marca de R$ 100 bilhões. A normativa baixada pela Receita Federal estabeleceu como prazo para adesão ao regime especial o dia 31 de outubro deste ano, uma janela de pouco mais de sete meses. Se o atual cenário político não melhorar – e tudo indica que pode piorar com o processo de impeachment da presidente no Congresso Nacional –, o RERCT corre o risco de ser um fracasso do ponto de vista da repatriação de recursos. Com certeza, quando decidiu nomear o ex-presidente Lula para a Casa Civil, na tentativa de garantir ao companheiro de partido foro privilegiado nas investigações da Lava Jato, a presidente Dilma não considerou os impactos disso na economia. Se calculasse melhor os riscos da medida, saberia que somente no caso específico do RERCT o governo pode deixar de arrecadar bilhões de reais, com impacto futuro ainda não calculado, pois todos os bens e ativos regularizados passarão a fazer parte do patrimônio tributável dos contribuintes brasileiros. Apesar da instabilidade política e econômica da nova crise, o RERCT continua sendo uma excelente oportunidade para o contribuinte regularizar a situação dos bens e ativos não declarados no exterior. Apesar de ter ficado conhecida como Lei da Repatriação, o regime não exige a repatriação dos bens. Ele abre uma janela para a regularização dos bens – o contribuinte pode regularizar seu patrimônio e mantê-lo em outro país. A principal vantagem de ter esses bens regularizados é que o contribuinte poderá realizar um planejamento tributário desse patrimônio no exterior, estudando as melhores oportunidades de investimento e organizando seu patrimônio antes mesmo da adesão ao regime. É importante ter uma visão de futuro e não apenas a intenção de regularizar o passado. O pagamento do tributo devido terá como base de cálculo o valor dos ativos em 31 de dezembro de 2014. A partir dessa data, o patrimônio regularizado passa a gerar outros compromissos tributários que deverão ser pagos, inclusive com retificações do Imposto de Renda e do Banco Central nas declarações de 2015. Por isso, é hora de planejar, organizar e se preparar para a adesão no tempo estabelecido pela regulamentação. Apesar das trapalhadas políticas, o contribuinte brasileiro não deve abrir mão da oportunidade de ter seu patrimônio regularizado, para seu bem e de seus herdeiros. Nereu Domingues é advogado especializado no assessoramento da família empresária e de grandes fortunas. Publicado na Gazeta do Povo]]>