A importância dos "considerandos" de um contrato

Antonio Eduardo Reichmann Seixas

Um contrato escrito sempre resulta de uma negociação, por mais rápida e simples que ela seja. Quanto maior a complexidade e os valores envolvidos, mais longas e detalhadas tendem a ser as minutas contratuais e mais tempo acabam durando as discussões entre as partes e os seus advogados. Há casos em que o texto do contrato é debatido linha por linha, palavra por palavra.

Ainda que os documentos finais de uma negociação sejam minuciosos e robustos, nem todos os elementos do acordo podem ser traduzidos em cláusulas. O histórico das tratativas negociais, o contexto em que elas ocorreram, os motivos de cada uma das partes para fechar o negócio, são exemplos de aspectos essenciais para a compreensão completa (e correta) de uma relação contratual.

Tornou-se uma prática muito comum descrever as circunstâncias negociais em uma espécie de introdução do contrato, antes das cláusulas propriamente ditas, com frases que começam com a expressão “considerando que…”. Os chamados “considerandos” não são imprescindíveis para que um contrato seja válido e eficaz de acordo com as leis brasileiras, mas isso não significa que o seu conteúdo não tem valor jurídico ou deve ser dispensado. Muito pelo contrário. Um preâmbulo bem detalhado, com uma descrição fiel e objetiva do contexto negocial, pode ser decisivo para que um árbitro ou juiz compreenda exatamente qual foi a intenção das partes ao celebrar um contrato.

O principal objetivo dos “considerandos” é fornecer elementos para a interpretação das cláusulas contratuais, registrando os fatos que antecederam a assinatura dos documentos finais e os motivos e as razões das partes para fazê-lo. Como o conteúdo dos “considerandos” é naturalmente descritivo, o valor atribuído a eles nem sempre é o mesmo das “declarações preceptivas”, denominação técnica para as cláusulas propriamente ditas, que estabelecem deveres e obrigações às partes contratantes. Ainda assim, essas disposições devem estar sempre em consonância com as considerações iniciais. Afinal, a interpretação de uma relação contratual não se restringe à leitura fria do texto inscrito nos documentos finais.

Por outro lado, quem assina um contrato concorda expressamente com todos os seus elementos, incluindo os fatos e motivos que foram relatados no preâmbulo. Em determinadas situações, os “considerandos” podem trazer informações que constituem motivos determinantes para a celebração de um acordo. Caso a descrição das circunstâncias se revele falsa ou enganosa, a parte prejudicada poderá alegar ter sido vítima de erro e pleitear a anulação do negócio (Código Civil, art. 138 e seguintes).

Em resumo, não importa qual seja o objeto ou a complexidade de um acordo negocial, as partes não podem deixar de prestar muita atenção nos “considerandos” do contrato. O conteúdo desse preâmbulo tem, sim, valor jurídico e pode ser decisivo para a solução de conflitos relacionados ao negócio celebrado entre as partes.

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