Modulação de efeitos das decisões de tribunais superiores e a utilização de créditos tributários na via administrativa

Bruno de Castro e Claudio Batista

Não é novidade que os tribunais superiores costumam modular as decisões judiciais que tratam de temas tributários relevantes, que potencialmente representam uma perda de arrecadação dos entes federativos, ou como a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional prefere argumentar, julgamentos que se favoráveis aos contribuintes, podem provocar um “rombo de bilhões de reais no caixa da União”.

Como exemplo recente, temos o julgamento proferido pelo Superior Tribunal de Justiça em 14/12/2023 ao analisar a exclusão do ICMS Substituição Tributária das bases de cálculo do PIS e da Cofins em sede de recursos repetitivos, onde a corte entendeu pelo provimento da tese, aplicando ao caso a mesma razão de decidir que o Supremo Tribunal Federal usou no Tema 69 da repercussão geral, que tratou da exclusão do ICMS das bases de cálculo das contribuições, a chamada ‘tese do século’.

E, na mesma linha da Suprema Corte ao julgar a exclusão do ICMS das bases do PIS e Cofins, o STJ entendeu por modular os efeitos da decisão, de modo que a exclusão do ICMS-ST da base de cálculo da contribuição para PIS e Cofins só é válida desde 14 de dezembro de 2023, exceto nos casos em que já havia ação ajuizada ou procedimento administrativo discutindo o tema, conforme acórdão publicado em 28/02/2024.

E, aqui, visualizamos uma importante ressalva que sempre é replicada pelas cortes superiores ao modular os efeitos de suas decisões, que seria a preservação do direito dos contribuintes ao indébito nos casos em que há ação judicial ajuizada ou processo administrativo fiscal em andamento em data anterior à decisão que decidiu o mérito, ou seja, antes de 14/12/2023.

Dessa forma, há o alerta quanto à necessidade de anteciparem o ajuizamento de ações, de modo a protocolar as medidas judiciais antes que as cortes terminem o julgamento de mérito de tese tributária que será julgada em recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça ou em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal.

Com o ajuizamento de medida judicial, o direito à repetição do indébito ou compensação do que foi indevidamente recolhido restará preservado desde os 5 (cinco) anos anteriores à data de ajuizamento.

Contudo, chama atenção a preservação dos procedimentos administrativos fiscais em andamento, visto que no caso do contribuinte mais arrojado que entendeu pela utilização do crédito tributário dos últimos 5 (cinco) anos diretamente em sua escrita fiscal, seguindo o procedimento do pedido de ressarcimento/restituição e compensação, ainda que o crédito tenha sido glosado pela Receita Federal, também terá seu direito preservado.

Obviamente que o contribuinte que optou por discutir a tese tributária por meio de mandado de segurança não estaria sujeito aos riscos inerentes ao aproveitamento administrativo dos créditos tributários. Ainda assim, o tema demanda uma importante reflexão, visto que o risco financeiro envolvido pode se mostrar irrelevante, face ao ganho propiciado pelo aproveitamento dos créditos tributários diretamente na escrita fiscal.

Recentemente, vimos a derrubada da multa isolada de 50% sobre o valor do crédito tributário pela mera não homologação da compensação realizada pelo contribuinte, quando o Supremo Tribunal Federal julgou a matéria em sede de repercussão geral, entendendo que a exigência seria inconstitucional, visto que o ato de apurar e compensar créditos tributários não seria ato ilícito capaz de gerar sanção tributária.

Dessa forma, na hipótese de compensação não homologada, e ressalvados casos em que a Receita Federal poderia entender que houve simulação, dolo ou fraude, o contribuinte estaria sujeito somente a multa de mora, que pode alcançar no máximo 20% do valor do débito e não passa por atualização, bem como incidência da taxa Selic sobre o principal.

Ainda assim, a não homologação da compensação oportuniza a inauguração do contencioso administrativo fiscal, que levará o processo até o CARF com suspensão da exigibilidade do crédito tributário, de modo que não pode ser óbice à obtenção da certidão de regularidade fiscal pelo contribuinte, e pode se estender por anos a fio, tempo suficiente para que a tese tributária seja julgada pelos tribunais superiores.

Com isso, há de se refletir sobre os riscos envolvidos no aproveitamento administrativo dos créditos e sua possibilidade dentro do contexto de cada contribuinte, especialmente se considerarmos os posicionamentos recentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, além de na hipótese de julgamento desfavorável da tese, a existência de programas de recuperação fiscal que são inaugurados reiteradamente pelo governo, oportunizando a redução de juros de mora e da multa, muitas vezes alcançando até 100% de desconto.

Cláudio Henrique Resende Batista e Bruno Hiram Dias Pacito

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